A lição da guerra de 1812 entre EUA e Inglaterra para o Brasil

Uma guerra de que a maioria nunca ouviu falar ajudou o Brasil a se tornar independente
A lição da guerra de 1812 entre EUA e Inglaterra para o Brasil

Embora 1812 seja um ano com pouco destaque na historia do Brasil, ele foi um ano importantíssimo na política internacional, tendo afetado o futuro do Brasil como nação. Independente da Inglaterra desde o fim da guerra revolucionária, que terminou em 1783, os Estados Unidos ainda se formava como nação quando uma disputa comercial entre os dois países foi levada às ultimas consequências na Guerra de 1812. Foram necessários três anos de conflitos para a questão ser resolvida. Os brasileiros, que observaram todo esse capítulo, aprenderam lições importantíssimas na construção de uma nação livre. Porém, todo o aprendizado parece ter sido esquecido e, pela nossa liberdade, eu as resgato aqui.

O Contexto histórico da guerra de 1812

Quase 30 anos após a independência, os EUA ainda engatinhavam como nação, ao passo que a Inglaterra gozava de ampla dominância política, comercial e bélica. Embora ainda travasse uma guerra contra a França de Napoleão, os ingleses tinham controle sobre suas colônias.

Como de praxe para a maior potência da época, a Inglaterra impunha sua hegemonia quando e aonde queria sem muitos empecilhos, até mesmo sobre os EUA, recém-independentes. Os ingleses navegavam livremente nos mares e rios dos EUA, sequestravam marinheiros americanos e impunham crescentes limites ao livre de comércio entre os Estados Unidos e a França.

Do outro lado da balança, os americanos sustentavam precariamente um exército miliciano amador e mal organizado, supridos e protegidos por uma marinha sem qualquer expressão. Os americanos, por mais otimistas e crentes em conto de fadas que pudessem ser, eram totalmente incapazes de enfrentar os ingleses de igual para igual. Embora derrotados na Guerra de Independência, os ingleses se mantiveram como os mestres dos mares e profissionais da arte da guerra. Impunham sua vontade a revelia do que os EUA, independente, desejassem. O palco estava armado.

A relação entre os dois países seguia degringolando até que o presidente americano, James Madison, um dos redatores da constituição norte-americana, decidiu por um basta. Era hora de acabar com as violações de soberania. A submissão dos EUA tinha que terminar. Madison julgou, precipitadamente, que poderia ter sucesso rápido e fácil, já que os ingleses travavam uma guerra na Europa contra Napoleão. Aproveitando do contexto em que a Inglaterra se encontrava, Madison enviou uma carta ao congresso pedindo guerra, e o congresso formado em sua maioria por representantes nascidos após a guerra de independência aceitou o pedido com entusiasmo.

A guerra de 1812 entre Estados Unidos e Inglaterra

Os americanos iniciaram o conflito com ofensivas por terra, atacando os territórios ingleses no Canadá e no centro do continente do que é hoje os Estados Unidos. Foi um fiasco. Os milicianos americanos, apesar de seu maior numero, não estavam organizados para enfrentar nem mesmo pequenas guarnições inglesas e indígenas. Um exemplo disso foi a Batalha da Fazenda Crysler, onde 900 soldados e voluntários canadenses e ingleses enfrentaram e derrotaram 4.000 soldados americanos em combate, sendo que os Estados Unidos tinham, nesta batalha, outros 5.000 soldados na retaguarda.

Batalha entre Estados Unidos e Inglaterra pelo controle do rio St Lawrence

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A batalha da Fazenda Crysler (The Battle of Crysler’s Farm)

Os ingleses retaliaram de forma inteligente. Sem tropas para um ataque terrestre optaram pela defensiva e pela parceria com as tribos indígenas para que estes engrossassem a resistência. No mar, no entanto, foram mais enérgicos. Decretaram embargo completo do comércio marítimo dos Estados Unidos, arruinando a economia americana em pouco tempo. A vitória sobre Napoleão em 1814 ajudou acelerar as coisas e os ingleses destacaram suas divisões mais experientes para o front dos EUA. O pior estava por vir.

De forma calculada e muito bem planejada, os ingleses mandaram uma pequena guarnição desembarcar próxima à cidade de Washington e arrasá-la por completo. James Madison e sua mulher, apanhados de surpresa, fugiram com a roupa do corpo e alguns pertences pouco antes da chegada do inimigo. A casa do presidente da república dos EUA, um dos lugares mais protegidos e vigiados no mundo de hoje, foi incendiado por tropas inglesas, algo que poucos sabem. Como era de se esperar, os soldados ingleses vandalizarem todo o recinto e levaram inúmeros pertences pessoais do Madison antes de atear fogo no prédio.

Impedidos de avançar no campo de batalha, os americanos perceberam que corriam sérios riscos de se tornarem uma colônia inglesa mais uma vez. Mas, desse prognóstico tétrico veio a reação. Os americanos organizaram e mobilizaram defesas e táticas mais eficientes, e tiveram sucesso em impedir planos para uma nova invasão inglesa. No mar, os poucos barcos da marinha americana foram usados com maestria, freando a marinha inglesa em pontos chave. O que o jovem, Estados Unidos da América, aprendeu era que não conseguiria ganhar a guerra que ele mesmo decretara, mas que certamente ainda era capaz de se defender com o pouco que tinha.

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Ilustração da batalha que inspirou o hino americano, The Star Spangled Banner

A guerra terminou em 1815 com um impasse. Politicamente ninguém ganhou, mas estrategicamente os EUA sofreram um retrocesso, pois se permaneceram incapazes de exercer sua soberania frente a um poder maior que resolvesse exercer a dele. Para piorar a questão, os americanos terminaram o conflito ainda mais endividados e dependentes economicamente da Inglaterra do que em 1812.

Os EUA dominante, livre e soberano que conhecemos hoje, surgiu somente com o final da Segunda Guerra Mundial.

Por que isso foi relevante para o Brasil independente?

Nossos observadores à época acompanharam com interesse esse evento. Nossa independência foi declarada sete anos depois do final desse conflito. Uma das primeiras medidas do Brasil independente foi a criação da Marinha Imperial, pois a organização de uma defesa profissional permanente era essencial para garantir nossa soberania nos mares e rios, tanto contra Portugal quanto outros países interessados nos nosso território e recursos.

Um dos exemplos de quando isso foi necessário ocorreu em 1862, quando os ingleses tentaram violar a soberania brasileira no que ficou conhecido como a Questão Christie. Ao invés de aceitar a vontade inglesa, tida como absoluta, Dom Pedro II decretou o reforço das já formadas forças armadas do Brasil e ordenou o bombardeio de qualquer navio inglês que tentasse abordar embarcações mercantes brasileiros. O resultado? O embaixador britânico Edward Thornton se desculpou publicamente em nome da Rainha Vitória, uma tremenda vitória diplomática internacional.

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Armada Imperial em 1860

Segundo foi a organização de Estado do Brasil. Desde a independência em 1822 até nossa primeira constituição, em 1824, a Coroa realizou uma série de debates sobre como deveríamos organizar nosso país. Dois grupos conduziam o debate, os que queriam descentralizar a política e os que queriam um poder central unificador, responsável pela proteção de todo território nacional. A Guerra de 1812 serviu como baliza e os unificadores ganharam, o que foi essencial para que o Brasil sobrevivesse intacto ao que estava por vir no século XIX, como os conflitos com Argentina e Paraguai, por exemplo. Apesar de que hoje temos que decentralizar o poder político, na época a decisão pela centralização foi providente.

Terceiro foi limitar a dependência econômica da ex-metrópole. Os Estados Unidos da América foram os primeiros a reconhecer o Brasil como país soberano e independente e logo se transformou num dos maiores parceiros comerciais, assim como a Inglaterra. Portugal, por sua vez, foi perdendo lentamente suas amarras com a antiga colônia e deixou de ser a influencia econômica dominante em poucas décadas.

De modo universal, esse episódio foi uma grande lição política para países recém-independentes. Estava ali, gravado a ferro e fogo, a prova de que preservar a liberdade, território e interesses políticos e comerciais é parte integrante do exercício de soberania. E, para isso, é preciso força bélica organizada profissionalmente e bem mantida, sempre. A falta de prioridade para com nossas forças armadas e forças de segurança demonstra o nítido intento de agir na contramão dos aprendizados que garantem nossas liberdades e o exercício de nossa soberania. Agora você quem sabe, compartilhe.
http://lpbraganca.com.br/guerra-de-1812-estados-unidos-inglaterra-brasil/

Comentários

  • Lembrando que 1812 foi o ano em que Napoleão invadiu a Rússia, o que decidiu o futuro da Europa.
  • editado October 2017
    Sobre a Segunda Guerra de Independência, nome que os americanos dão à sua guerra de 1812, eles não foram tão defensivos quanto o autor do artigo deu a entender.
    Se tivessem sido vitoriosos, teriam anexado o Canadá, uma das motivações do conflito afins com a doutrina expansionista que aumentaria os Estados Unidos para oeste sobre os territórios indígenas e para o sul, conquistando boa parte do México.
  • editado October 2017
    Um dos exemplos de quando isso foi necessário ocorreu em 1862, quando os ingleses tentaram violar a soberania brasileira no que ficou conhecido como a Questão Christie. Ao invés de aceitar a vontade inglesa, tida como absoluta, Dom Pedro II decretou o reforço das já formadas forças armadas do Brasil e ordenou o bombardeio de qualquer navio inglês que tentasse abordar embarcações mercantes brasileiros. O resultado? O embaixador britânico Edward Thornton se desculpou publicamente em nome da Rainha Vitória, uma tremenda vitória diplomática internacional.

    Tem mais coisa aí...
    O autor esqueceu de citar que a Marinha Real bloqueou o Porto do Rio de Janeiro e que a Marinha Imperial não se meteu a besta de desafiá-la.
    A tremenda vitória diplomática internacional pode ter sido uma vitória, mas não foi tão tremenda assim.

    Mas o mais interessante neste fato é que desmente o mito de que na Guerra do Paraguai, iniciada poucos anos depois, o Império do Brasil foi apenas um marionete nas mãos da Inglaterra que queria destruir a - por Monã, tem gente que acredita nisto... - ascenção do Paraguai como potência regional  capaz de confrontar os interesses britânicos na América do Sul.

    Como se vê, o Império não se dava tão bem assim com a Côroa Britânica e até onde podia peitava a Rainha, militarmente até quando necessário.
    Longe léguas da nação submissa do mito esquerdista.

    Nota: O mesmo para o regime militar de 1964, apresentado pela Esquerda como "entreguista" aos interesses americanos.  Geisel ordenou a construção das usinas nucleares de Angra apesar da declarada oposição dos Estados Unidos e mais tarde dispensou a ajuda militar americana (um dinheirão para os padrões da época) por não aceitar interferência deles em nossos assuntos internos.
  • Geisel ordenou a construção das usinas nucleares de Angra apesar da declarada oposição dos Estados Unidos

    Esse aí foi o mais comunista dos nossos presidentes, criando estatais inúteis para todo lado e fazendo um acordo imbecil com a Alemanha para construir uma usina de enriquecimento de urânio com uma tecnologia não testada e que, pra variar, não deu certo. O zamericanos temiam justamente isso: que o Brasil fizesse enriquecimento de urânio e daí teria potencial para produzir a bomba atômica. No fim, com tecnologia própria, a centrifugação (e tecnologicamente melhor do que os congêneres no mundo), o Brasil enriqueceu urânio... Mas agora somos signatários da não proliferação de armas nucleares...
  • Botânico disse:
    Geisel ordenou a construção das usinas nucleares de Angra apesar da declarada oposição dos Estados Unidos

    Esse aí foi o mais comunista dos nossos presidentes, criando estatais inúteis para todo lado e fazendo um acordo imbecil com a Alemanha para construir uma usina de enriquecimento de urânio com uma tecnologia não testada e que, pra variar, não deu certo. O zamericanos temiam justamente isso: que o Brasil fizesse enriquecimento de urânio e daí teria potencial para produzir a bomba atômica. No fim, com tecnologia própria, a centrifugação (e tecnologicamente melhor do que os congêneres no mundo), o Brasil enriqueceu urânio... Mas agora somos signatários da não proliferação de armas nucleares...

    Uma fortuna jogada no lixo .
  • Emmedrado escreveu:
    Uma fortuna jogada no lixo .
    Não totalmente. As usinas de Angra 1 e Angra 2 fornecem 20% da energia consumida no Rio e nos salvaram de muitos apagões. Ainda bem que desenvolvemos nossa própria tecnologia de enriquecimento de urânio para não dependermos dos outros e nem correr risco de boicotes.

    Mas seria ótimo se todo o dinheiro desperdiçado tivesse servido para terminar Angra 3, por exemplo.
  • Bem, como o Brasil tem o desagradável costume de fazer negócio da égua, a Angra 1 foi construída pela Westinghose (a parte civil foi nossa, mas o reator e os demais sistemas eram coisa dela). A ideia era: taí o reator, taí as chaves para operá-lo e boa sorte. Como vinha o urânio? O Brasil mandava o minério pros EUA, lá ele seria enriquecido, devolvido mediante régio pagamento e depois de esgotado, pertencia ao zamericanos. Se o reator enguiçasse? Tinha que trazer os engenheiros americanos, arrumar casas americanas para eles e famílias, arrumar comida americana para eles e para os cachorros, pagar pelas peças e serviços e a cada novo enguiço, começava tudo de novo.
    E enguiços não faltaram. A Westinghouse comprometeu-se apenas em concertar o reator, pois estava na garantia, mas os lucros cessantes, o não funcionamento, os funcionários parados... Isso ficava por nossa conta.
    Isso é Brasil.

    O Figueiredo dizia que nós não podíamos ficar atrasados nessa tecnologia (oh! ficamos bem adiantados com uma que não deu certo). Os físicos nucleares brasileiros nem sequer foram ouvidos. Na opinião deles, o ideal seria o reator a urânio metálico natural, que usaria sódio líquido como refrigerante e sairia bem mais barato do que a zorra que fizeram. Mas se sai mais barato, como justificar as propinas?
  • Os generais direitistas e lambe-botas do zamericanos aprontaram mais uma: Compraram trens produzidos na HUNGRIA e que foram usados em SP, RS, RJ... Foram sucateados no inicio dos anos 80 porque era impossivel conseguir peças de manutenção.

     
  • Botânico escreveu:
    E enguiços não faltaram. A Westinghouse comprometeu-se apenas em concertar o reator, pois estava na garantia, mas os lucros cessantes, o não funcionamento, os funcionários parados... Isso ficava por nossa conta.
    Isso é Brasil.
    As usinas nucleares foram chamadas de 'vagalumes' porque acendiam e apagavam o tempo todo. Até o transformador de saída, uma coisa básica, que o Brasil poderia ter fornecido sem problemas, mas veio de fora, deu defeito.

    Hoje em dia, depois de trocar muita coisa com a ajuda dos alemães, elas funcionam sem problemas.
  • editado October 2017
    Com a grana que gastaram com angra 1, seria possivel fazer uma usina hidreletrica no rio amazonas para abastecer o Brasil inteiro e ainda ajudar a cumpanherada a redor.

    Itaipi custou U$12bi e parece que só angra custou U$40. Dados do google.
  • editado October 2017
    Compraram trens produzidos na HUNGRIA e que foram usados em SP, RS, RJ...

    Outra lambança das boas. O zamericanos ficaram putos da vida com isso, pois o Brasil era considerado mercado reservado para os produtos das empresas do zamericanos. Bem, o tal trem húngaro supostamente tinha velocidade o bastante para fazer a ligação entre São Paulo e Rio em apenas 4 horas. Tal "trem de aço" fazia isso em 13 horas. Imagem só o avanço!
    Já na viagem deu bode: o navio passou por uma baita tempestade e os trens deram umas boas chacoalhadas e resultado: já no desembarque tiveram de ser reparados. Começamos mal. E terminamos pior: apenas um eixo por vagão era motor e resultado: o trem não conseguia subir a Serra da Mantiqueira: precisava ser rebocado por uma locomotiva. Certo, o trem era veloz mas... sacomé: quando chega numa curva, o trem tem de reduzir sua velocidade, senão descarrilharia. E curva é  o que não falta na estrada que liga São Paulo ao Rio. Sacomé, na época da sua construção, vinha os coroné do café exigindo que se fizesse uma curva para passar nas fazendas deles e os ingleses que a construíram não se faziam de rogados, já que ganhavam por milhas...
    Resultado: o trem que deveria ligar São Paulo e Rio em apenas 4 horas acabou por fazê-lo... em 13. Quando via esse trem passando em Pindamonhangaba, onde minha avó mora, eu só via os vagões com bancos vazios...

    Alguém manda essa pro Bolsonaro? Afinal ele justifica as estatais nos tempos dos milicos pois a iniciativa privada não tinha como bancar o zinvestimentos...
  • editado October 2017
    O trem hungaro foi trocado por produtos agricolas com o leste europeu. Acho que o Brasil não conseguiria mesmo compar de outro lugar pois não tinha moeda forte.

    Ele até subia a serra mas em velocidade muito reduzida. 

    No RS, até que funcionou bem pois fazia a linha Porto Alegre - Uruguaiana, que era só plano. Em alguns trechos, conseguia desenvolver 110Km/h. Só conseguia competir com o onibus porque trabalhava no prejuizo..

    Quando construiram a ponte sobre o Rio Guaiba, os trens de passageiro ficaram em desvantagem porque não existe até hoje (nem nunca exisitirá) uma ponte ferroviaria sobre o Rio Guaiba. O trem precisa fazer um balão enorme que deve aumentar uns 100Km a viagem. 
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